quarta-feira, 6 de julho de 2011

Internação compulsória dos usuários de crack: tira essa gente dai!

O tema desse trabalho deve estar ligado ao conceito de marginalidade, que por hora é bastante amplo e muito usado pelo senso comum. A realidade atual dos centros urbanos não pode ser analisada de forma solta, é fundamental compreender o processo histórico da construção desses espaços e suas relações sociais.
Pensando sobre as problemáticas atuais do Rio de Janeiro, cidade a qual eu vivo, resolvi escolher um tema atual e polêmico para os que aqui vivem. Não é novidade para ninguém que desde a escolha do Brasil e principalmente da cidade do Rio para sediar a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016, esse lugar virou um furacão de investimentos, obras, mexe daqui mexe de lá. O que estava largado durante décadas precisava ser revisto e isso deu pano para manga, o que fazer com as favelas dominadas pelo tráfico de drogas? O que fazer com a população de rua? O que fazer com o transporte precário? Várias perguntas foram surgindo e juntamente as respostas do Estado, sociedade civil e iniciativa privada compareceram.
Dentre milhares de questões, vou trazer uma delas que é: o que fazer com os usuários de crack? Pois bem, a prefeitura do Rio respondeu: internação compulsória. É a solução ideal prevista por eles e que agrada grande parte da população. Há sempre um lado obscuro dentro de nós que deseja o desaparecimento de todas essas pessoas que enfeiam a “cidade maravilhosa”, é claro que isso não é verbalizado. O discurso vem “embriagado” na lógica de “salvação” dessas vidas, mas há sempre os questionadores que percebem que nem tudo são flores.
No passado, os leprosos ou os acometidos pelo conjunto de pestes que assolou a Europa na Idade Média eram mantidos em lares, asilos e prisões que tinham por objetivo separar essa parcela da população dos demais. Os muros e os portões são um marco simbólico significativo que geram a segregação, dentro desses espaços os que ali estão são isolados do restante da sociedade, inaugura-se então uma nova temporalidade, que se separa da temporalidade “normal” do resto das dinâmicas sociais. Em outras palavras na institucionalização, esses usuários estão em um novo enquadramento social, que os tira do resto da sociedade, e o mais crítico, tira o resto da sociedade deles.
A lógica da internação está baseada em dois principais argumentos, o primeiro é: ao internar, gera-se ou ao menos inicia-se, um processo de cura da dependência dos usuários da droga; o segundo é: ao internar, esses usuários estarão impedidos continuarem se destruindo e destruindo suas famílias.
A internação compulsória gerou um amplo debate entre estudiosos e profissionais da saúde mental, notando-se ao longo do tempo que esse tipo de método terapêutico para pacientes psiquiátricos, simplesmente não funciona. A internação serve, apenas, como meio de impedir um perigo imediato do paciente para sua própria segurança ou de outras pessoas, mesmo nestes casos a internação só pode durar pouco tempo, pois essa intervenção pode não só ajudar como atrapalhar no tratamento do distúrbio psíquico.
As ações realizadas nas “cracolândias” são feitas pelos agentes da prefeitura que recolhem todos os que estão no local e, pelo que sabemos, os levam para hospitais públicos onde são internadas, após esse primeiro atendimento essas pessoas passam a habitar locais sociais restritos a elas e aos cuidados de funcionários que se ocupam delas. Esses “abrigos” são, em sua maioria, distante do local onde essas pessoas se encontravam inicialmente, ou seja, perde-se a referencia e corta-se qualquer tipo de vínculo daqueles sujeitos com o meio.
É fundamental notarmos que há diversos tipos de usuários, e que mesmo para aqueles dependentes que se encontrem em situação de vulnerabilidade social tendo sua vida em risco ou colocando a de outros, a internação é em muitos dos casos desnecessária, caso o usuário seja internado, essa intervenção deve ser emergencial e temporária. Outro ponto é a necessidade de um tratamento ambulatorial como alternativa ou que se siga a internação, pois sem o mesmo a reincidência será praticamente incontornável, gerando uma “roda-viva” de internar e “desinternar”.
Parece-me que a internação compulsória proposta para os “craqueiros”, (como são conhecidos os usuários do crack) serve, principalmente, para atender a outra demanda, que não é a de saúde e sim a segregação e reenquadramento social dos que queremos varrer para de baixo do tapete. A lógica de reorganização e limpeza da cidade características dessa gestão, parece ter encontrado uma boa solução para aqueles que incomodam, no entanto, neste caso a medida adotada não é justificável, seja do ponto de vista moral, seja do ponto de vista jurídico.

Rio de Janeiro, 05 de Julho de 2011.

Roberta Matos de Menezes.

Um comentário:

  1. Os autores trabalhados na disciplina poderiam ter contribuído para sua análise.

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